Artigo publicado em 29/08/2024
O Enterococcus faecalis é uma bactéria gram-positiva oportunista frequentemente associada a infecções persistentes do canal radicular e ao insucesso de tratamentos endodônticos. Uma característica marcante dessa bactéria é sua capacidade de sobreviver a condições adversas, como ambientes alcalinos, comumente encontrados durante tratamentos de canal radicular. Mas o que torna o E. faecalis tão resistente e capaz de perpetuar a inflamação? Um dos fatores recentemente estudados é a liberação de vesículas de membrana (VMs) pela bactéria.
O Que São Vesículas de Membrana?
As vesículas de membrana são pequenas estruturas esféricas liberadas pelas bactérias e envoltas por uma bicamada lipídica. Elas carregam uma ampla gama de moléculas, incluindo proteínas, ácidos nucleicos e metabólitos, provenientes da célula bacteriana. Essas vesículas desempenham um papel importante em vários processos, como a comunicação entre células, modulação do sistema imunológico e transporte de fatores de virulência.
No caso do E. faecalis, as VMs têm sido objeto de pesquisa por seu papel no desenvolvimento de inflamações persistentes, principalmente em condições de pH elevado, como as encontradas no interior de canais radiculares tratados com hidróxido de cálcio.
O Estudo: Comparando Vesículas em pH Neutro e Alcalino
O estudo “Proinflammatory Effect of Membrane Vesicles Derived from Enterococcus faecalis at Neutral and Alkaline pH” investigou o impacto das VMs derivadas de E. faecalis em pH neutro (7.4) e alcalino (9.0). A escolha do pH alcalino tem relação direta com os ambientes criados em canais radiculares durante tratamentos endodônticos, quando são utilizados agentes antimicrobianos alcalinos, como o hidróxido de cálcio.
Os resultados indicaram que as VMs produzidas em condições alcalinas eram menores em diâmetro, porém mais carregadas com proteínas associadas à virulência, como proteases e componentes da parede celular, que podem ativar as vias inflamatórias nas células humanas.
O Efeito Pró-inflamatório das Vesículas de E. faecalis
O estudo revelou que, quando as vesículas de membrana de E. faecalis entram em contato com células imunes, como os macrófagos, elas desencadeiam a produção de citocinas pró-inflamatórias, como a interleucina-1β (IL-1β), interleucina-6 (IL-6) e o fator de necrose tumoral alfa (TNF-α). Esses mediadores são cruciais na amplificação da resposta inflamatória.
Além disso, vesículas produzidas em pH alcalino mostraram-se mais potentes na indução de inflamação, provavelmente devido à maior concentração de proteínas de virulência, como a lipoteicoico e proteases, que interagem com os receptores Toll-like (TLR2) nas células do hospedeiro, ativando a via de sinalização NF-κB, que regula a expressão de genes pró-inflamatórios.
Implicações para o Tratamento Endodôntico
Esse estudo oferece uma nova perspectiva sobre por que o Enterococcus faecalis é tão difícil de eliminar em casos de infecção persistente no canal radicular, mesmo após procedimentos rigorosos de desinfecção e o uso de agentes antimicrobianos alcalinos. As vesículas de membrana permitem que a bactéria continue a exercer seus efeitos patogênicos, promovendo a inflamação crônica e, potencialmente, contribuindo para o fracasso do tratamento.
Além disso, essas vesículas são capazes de sobreviver às condições alcalinas criadas pelo hidróxido de cálcio, o que indica que estratégias adicionais podem ser necessárias para neutralizar completamente o impacto dessas vesículas e garantir o sucesso do tratamento endodôntico.
Considerações Finais
O Enterococcus faecalis é uma bactéria altamente adaptável e resistente, capaz de liberar vesículas de membrana que carregam proteínas pró-inflamatórias e fatores de virulência, mesmo em condições adversas. Esse mecanismo torna o controle da infecção um grande desafio para os profissionais de endodontia, exigindo o desenvolvimento de novas abordagens para combater infecções persistentes.
Portanto, é fundamental que os profissionais de odontologia fiquem atentos às novas descobertas científicas e considerem ajustar suas estratégias de tratamento para lidar com patógenos resistentes como o E. faecalis, buscando maximizar as chances de sucesso em tratamentos endodônticos complexos.
Considerações da Endotoday sobre o fracasso endodôntico causado por essas vísiculas.
Neste artigo publicado no *Journal of Endodontics (JOE)*, os autores enfatizam que o uso exclusivo de hidróxido de cálcio não é suficiente para o controle bacteriano eficaz, mesmo quando combinado com soluções potentes de hipoclorito de sódio. Essa conclusão nos leva a refletir sobre a necessidade de buscar novas soluções antimicrobianas para o tratamento endodôntico. No entanto, é importante destacar que trabalhos pioneiros realizados por renomados pesquisadores brasileiros, os Professores Roberto Holland e Mário Roberto Leonardo, já haviam investigado e aplicado estratégias eficazes para esse desafio, desenvolvendo curativos de demora que combinam hidróxido de cálcio com paramonoclorofenol canforado (PMCC).
Durante suas pesquisas, mais de 20 diferentes fórmulas foram testadas, e a que demonstrou maior eficácia deu origem à conhecida pasta Calen com PMCC. Essa fórmula se mostrou especialmente eficiente, uma vez que o PMCC possui ação altamente efetiva contra bactérias aeróbias, que são frequentemente encontradas em casos de infecções endodônticas persistentes.
Portanto, tecnologias eficientes já existem há décadas e são capazes de resolver casos específicos de infecções intratáveis, proporcionando resultados clínicos de qualidade. Vale ressaltar que essas soluções não envolvem procedimentos mais dispendioso , como a ablação endodôntica, o que torna o tratamento menos invasivo e ainda altamente eficaz.
Este contexto reforça a importância de revisitar e integrar esses avanços científicos consagrados com as novas abordagens em desenvolvimento, buscando sempre o melhor resultado para o controle de infecções endodônticas.
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